Em entrevista com o site Women and Hollywood em Cannes, Kristen conversou sobre seu curta Come Swim e também falou muito sobre o feminismo na indústria do cinema. Confira a entrevista abaixo:

Obrigada por tirar um tempo para falar comigo. Women and Hollywood (Mulheres e Hollywood) foca no feminismo e nos negócios. Esse é um dos seus assuntos.
“Educar. Defender. Agitar.” Isso mesmo.

Pensei que você iria gostar. Então, de onde veio a inspiração para esse filme?
Eu estava um pouco fixada em uma imagem: uma pessoa dormindo no fundo do oceano, o que obviamente é um lugar muito desconfortável para um ser humano dormir, e ver esse contentamento nesse lugar tão estranho, a satisfação nessa isolação, me perguntei por que isso era algo tão prazeroso para ele.
Todo mundo, pessoas jovens principalmente, passam por esse tipo de coisa: sua primeira desilusão ou coração partido que te coloca nos isolamentos da vida. Você sente que não pode participar das coisas normais. Você se pergunta, “Que porra é essa? Estou aqui, parece que estou aqui, mas não estou. Estou saturada. Estou me movendo contra a maré.” Não é necessariamente depressão por mais que seja ansiedade e incapacidade de participar em coisas “normais”. Você engrandece essa dor quando você está pequeno, você acredita que a sua dor é diferente do normal.
Então, a ideia era originar essa dor e então assistir alguém, por um momento, perceber que está completamente bem. Ver esse único dia de duas perspectivas diferentes. Uma que é dele, e é muito gráfica, surreal e anormal. E então, você sai desse cenário, liga as luzes e percebe que, na verdade, todo mundo já passou por isso.

O começo desse filme definitivamente mostra o sentimento de estar simplesmente sobrecarregado e submerso, então essa explicação ajuda muito. Se você tivesse que descrever a história em apenas uma frase, o que você diria para as pessoas? “Come Swim” é…?
Eu diria que são duas perspectivas de um homem “se tornando.” Também, em termos do uso da narração do filme, fala sobre perspectiva e o jeito que você lembra da situação. Você pode se atacar com memórias, e então se você olhar para a mesma situação de uma outra posição, isso pode ser muito diferente.
Basicamente, eu pedi para meus dois atores ficarem em uma piscina e brincar de luta; eles fingiam afogar um ao outro, o que soa dramático, mas na verdade foi bem fofo. No filme, o personagem principal é um pouco difícil e se recusa a nadar; ele não gosta de água. Teoricamente, eles terminaram, e tudo o que ele está fazendo é pensar sobre o que ele podia ter feito de diferente para evitar estragar tudo. Ele continua se perguntando, “Por que eu não fui nadar com ela? O que eu disse? Deus, tudo sobre mim é terrível.”
Você começa a voltar ao seu banco de memórias, se perguntando o que você poderia ter feito de diferente. Mas, quando você passa disso, você percebe que essas foram memórias divertidas que você repele como se fossem horríveis.
Então, eu usei a mesma narração em lugares diferentes com leituras um pouco diferentes. Uma foi ameaçadora, agressiva e assustadora, e então as mesmas palavras foram ditas com risadas para criar uma memória diferente e adorável.

Isso foi pessoal pra você?
100 por cento.

O que fez você decidir escrever e dirigir? Quando você soube que queria fazer isso?
Eu queria fazer filmes desde que eu tinha nove ou dez anos de idade, assim como eu queria atuar. Eu assisti o processo desde que eu era um bebê. Minha mãe, Jules Mann-Stewart, é supervisora de roteiros e meu pai, John Stewart, era diretor assistente na televisão. Eu estava sempre no set com a minha mãe, e ela sempre trabalhou muito próxima dos diretores.
Eu queria estar no set. Eu amava o esforço da equipe. Eu realmente amava que as pessoas fariam coisas muito loucas, e eu pensei que a rotina disso tudo deve valer a pena. Ser parte de algo realmente atraente.
Quando fiquei mais velha e comecei a ser parte desse processo realmente, eu percebi o quão espiritual isso pode ser; a única coisa que levaria alguém a trabalhar tanto assim é essa natureza compulsiva, artística e protetora: a necessidade de proteger uma história, ter certeza de que a experiência de um pode ser transferida para outros porque vale a pena.
Os melhores diretores que trabalhei sempre fazem você sentir como se estivesse segurando um pote com água. Você precisa chegar na linha de chegada e está derramando em várias direções. Mas, se todos segurarmos uma parte igualmente, podemos chegar no final e a água ainda vai estar toda no pote.

É uma boa imagem. Tenho certeza que você trabalhou com alguns diretores que você amou e outros nem tanto. O que você aprendeu com eles – bons e ruins – que você levou para esse projeto?
Direção é um mundo estranho porque implica que você está dizendo o que as pessoas devem fazer. O melhor sentimento do mundo é querer algo, transferir esse desejo para outros, e assistir isso se tornar uma coisa egoísta para eles – algo que não tenha nada a ver com fazer um favor para mim ou fazer um trabalho satisfatório. É na verdade essa transferência de desejo. De repente, eles alcançam um lugar onde eles começam a possuí-lo por conta própria.
Dirigir nunca é corrigir, isso é a pior coisa. Você pode influenciar as pessoas, mas, no final do dia, você coloca as pessoas nos lugares porque você se sente inspirada por eles. Você quer assistir o que eles fazem.

Outro dia durante uma conversa do Women in Motion, Robin Wrighy disse para “nunca dizer não.”
Certo. Porque mesmo que você não goste de algo, não diga a eles. Não use essa palavra. Se alguém está seguindo um caminho, não os faça desviar. A razão pela qual você está lá é para explorar algo. Não é para controlar essa experiência. Você quer que alguém descubra e experimente. Eu não quero colocar as ideas em pacotes e entregar. Apenas quero colocar todos em uma sala, meditar sobre um assunto, capturá-lo, juntar tudo e entregar. Não sou muito pretensiosa quanto a isso.

Esse é o motivo pelo qual as mulheres são diretoras tão boas; nós sabemos como trazer muitas pessoas juntas porque é assim que socializamos. Falando sobre mulheres dirigindo, você fez Crepúsculo com Catherine Hardwicke. Apesar de ter sido o filme dirigido por uma mulher de melhor bilheteria naquela época, ela teve que aguentar um corte no orçamento de seu filme subsequente. Nos dias de hoje, ela continua a ter dificuldades com seus filmes. O que você pensa sobre isso e oportunidades para as mulheres?
Existe um valor absurdo em uma decisão focada no comercial. Eu quero que as pessoas vejam os filmes que trabalho. Quero que esses filmes alcancem o máximo de pessoas possível. Mas, quem realmente faz isso acontecer são muito compulsivas. Veja alguém como Andrea Arnold. Ela conta suas próprias histórias. Ela não é contratada. Ninguém mais poderia contar as histórias que ela está contando. São dela, vem dela. Sem dúvidas, é irritante que isso está levando tanto tempo para balancear. Não há igualdade nessa indústria.

Não está nem perto de ter. De 100 filmes bem sucedidos do ano passado, somente 4% eram dirigidos por mulheres.
Isso é sempre difícil de falar.

Eu sei. Não há uma resposta, mas você é uma pessoa tão dentro desse mundo. Você trabalhou com homens e mulheres, incluindo Kelly Reichardt. Todo mundo quer trabalhar com ela, e ainda assim ela recebe pouco dinheiro para seus filmes.
Eu sei, mas isso também fala sobre quem ela é.

Ela gostaria de um pouco mais de dinheiro.

Definitivamente, mas se você olhar para os tipos de filmes que ela faz, eles não fazem muito dinheiro.

Bom, eu também acredito que seja um ciclo vicioso. Se estivesse em mais cinemas, mais pessoas iriam assistir, e assim vai.
Claro. Você acha que eles não estão em mais cinemas porque ela é uma mulher?

Eu acho que alguns filmes não estão em mais cinemas porque eles não possuem orçamento o suficiente para garantir mais cinemas. Eles não possuem o marketing para empurrá-los além do limite. Mas, o último filme de Andrea Arnold, American Honey, foi bastante comercial. Poderia ter sido mais exibido e poderia ter sido considerado para o Oscar.
Fiquei chocada que não foi.

Certo. Não se eleva a ocasião, e isso fala pelo número enorme de críticos homens. É um ciclo muito difícil de quebrar. Você já viu e agora está entrando nisso. Você vai ser uma diretora, e quer continuar atuando e escrevendo. Você vai estar nesse mundo. Como você passa por isso?
Sou muito sortuda. Tenho pessoas que me escutam. Estou em uma posição de muita sorte.

É interessante porque eu vivo em Nova York, e eu escrevo sobre feminismo e Hollywood. Eu sempre fico um pouco chocada quando venho em um lugar como esse (Cannes) ou vou para Los Angeles e vejo o mecanismo por trás de tudo. Isso é algo que faz parte do seu cotidiano. Você parece ser um ser humano incrivelmente feliz e adorável. Eu não conheço você, mas as pessoas estranhamente acham que conhecem. Como você mantém sua identidade e ainda assim dá para eles o que precisam para promover seus filmes?
Agora é estranho porque não estou trabalhando para ninguém. Estou menos nervosa aqui porque não estou preocupada em representar um diretor e o jeito que ele quer que a história seja falada.

Porque o diretor é você.
Sim. Isso é uma viagem, e é incrível. Eu tive que abandonar a noção de que eu posso controlar o jeito que as pessoas me veem. Não posso. Quando você tenta, você começa a se tornar estranha e ironicamente falsa porque você quer que as pessoas pensem de um certo jeito.Honestamente, você literalmente só precisa ser protetora – mas não cautelosa – e ser honesta sobre o que você se importa e o que você não se importa.
Eu consigo falar com você porque isso é uma conversa, mas tenho que abandonar a ideia de que as pessoas irão ler isso, porque então você começa a pensar sobre como isso vai soar para eles. Essa conversa pode existir aqui e as pessoas podem ler pelo o que é, mas se dirigir para o mundo como um todo é esmagador. Eu não penso sobre isso. Eu apenas tento ter conversas individuais com as pessoas, e quando eu não tenho que falar com a imprensa, eu trabalho.

Você provavelmente recebe vários roteiros e você fez decisões muito interessantes. Eu amei Clouds of Sils Maria. Que filme ótimo. Fale um pouco sobre como você faz suas escolhas na atuação.
É sempre por instinto. Eu nunca sei o que vou fazer. Talvez tenha um assunto que eu queira explorar, mas isso é mais como cineasta do que como atriz. Como atriz, eu quero ler algo e sentir que isso vive tão completamente que eu precise proteger essa vida. É difícil para mim desenvolver projetos com as pessoas porque precisa existir em mim primeiramente para que eu possa honrar.

Então você também está interessada em produzir?
Não. Essa é a última coisa que eu quero fazer. Eu odeio reuniões de desenvolvimento. Se um personagem ainda não existe, é claro que eu estaria interessada em escrever e dirigir esse projeto. Mas, eu não sei se eu conseguiria necessariamente atuar em algo assim porque eu saberia que é uma farsa, eu saberia que eu inventei. Eu preciso sentir como se o personagem literalmente existiu, como se eu estivesse lendo um livro de história e as pessoas precisam saber sobre esse acontecimento.

Você teve muitas mulheres trabalhando nessa equipe. Foi algo planejado, ou elas eram apenas as melhores para o emprego?
Para ser honesta, elas eram as melhores para o emprego. Não foi totalmente intencional. Mas, eu acho que se eu tivesse uma equipe completamente masculina, eu teria notado e feito algo para consertar.

Fonte | Tradução: Equipe Kristen Stewart Brasil