Seberg foi exibido na manhã de hoje para os críticos de cinema no Festival de Veneza e a revista TIME escreveu um artigo falando sobre o filme e a performance da Kristen, que interpreta a personagem titular, Jean Seberg. Confira:

Uma vez que você vê o rosto de Jean Seberg, uma maravilha de sigilo e revelação parecido com a mudança de tons das luzes do cair da tarde, você nunca esquece. Seberg é provavelmente mais conhecida como a co-estrela do filme de 1960, Breathless, de Jean-Luc Godard, um filme que ajudou a introduzir a então recém nascida French New Wave para o mundo. Ela interpreta a femme fatale Patricia Franchini, uma americana em Paris aspirante a jornalista. Seu belíssimo namorado criminoso, interpretado por Jean-Paul Belmondo, assassina um policial e se esconde no apartamento de Patricia, mas no final, ao invés de protegê-lo, ela o leva para sua ruína. Como Patricia, o rosto de Seberg é encantador mas não é uma máscara completamente legível de uma jovem autoconfiança e ambição, meio doce, meio frio, enquadrado de um corte pixie da cor do sol. Ela é pequena com um esquema, leal a si mesma acima de todos.

Kristen Stewart, suas características tão nítidas e definidas, é completamente errada para interpretar Seberg – mas só até você assistí-la por 10 minutos, ou talvez 15, onde depois disso ela e a atriz misteriosa, atraente e desafortunada parecem mesclar em uma presença vibrante. Esse holograma humano Stewart-Seberg é o centro de Seberg, do diretor britânico Benedict Andrews, que está sendo exibido aqui em Veneza fora da competição. Seberg não é estritamente uma biografia; é o retrato verdadeiro de uma mulher, uma ativista política e também uma estrela de cinema, a qual a vida foi virada de cabeça para baixo por uma organização desonesta do governo. O filme é potente e cativante, mesmo quando seu elementos fictícios encontram com o espírito da verdade. E Stewart é fora do normal, mas isso dificilmente é uma surpresa. Ela está entre as melhores atrizes dos dias atuais, apesar de que chamá-la de “ótima” seja um desserviço com sua sutileza – talvez seja melhor chamá-la de mestre dos pequenos gestos. O piscar de seus olhos já é um dialeto.

Seberg foca em um período da vida da atriz, no final dos anos 60 e começo dos anos 70, durante a época em que ela era assunto – e vítima – de uma investigação lançada pelo programa COINTELPRO do FBI com orientação de J. Edgar Hoover. Seberg, que nasceu em Iowa mas fez seu nome principalmente em filmes europeus, era de acordo com todos uma atriz e ser humano pensativo, mas sua vida não era feliz, e o filme de Andrews oferece algumas explicações verdadeiras para isso. Ela atraiu a atenção do FBI porque ela doou dinheiro para vários grupos de Direitos Humanos nos anos 60, entre eles os Pantera Negra. Ela também estava envolvida em um breve relacionamento extraconjugal com o ativista Hakim Adbullah Jamal (interpretado aqui, com expressividade perfeitamente moldada, por Anthony Mackie).

Começando no final dos anos 60, após Seberg chegar em Hollywood para fazer um filme (o musical de 1969 Paint Your Wagon), o FBI a assediou, intimidou e espiou, se intrometendo em sua vida pessoal e espalhando rumores prejudiciais. Em Seberg, os dois agentes do FBI no caso são interpretados por Vince Vaugh e Jack O’Connell. É o personagem de O’Connell, Jack Solomon, que sente empatia pelo alvo dos dois, vendo que ela está sendo esmagada desnecessariamente pelos planos de Hoover para erradicar os grupos ativistas negros. O’Connell traz uma sombra profundamente humana para sua caracterização desse cara certinho do governo. Em uma das melhores cenas do filme – presumidamente uma fantasia, um pequeno fio de imaginação – Solomon aborda Seberg em um bar parisiense, por volta do começo dos anos 70, apresentando para ela seu arquivo do FBI. Ela olha para ele com raiva e curiosidade, e então o devolve. Esse é o jeito do filme de dar para Seberg a dignidade que ela foi negada na vida real. No filme, se não na vida, ela sabe a extensão do que estava sendo feito com ela; ela não poderia saber o alcance disso enquanto ela estava vivendo, e sofrendo.

Em 1970, quando o departamento soube que Seberg estava grávida de quatro meses, eles espalharam rumores de que um líder dos Pantera Negra era pai da criança. (No filme, Jamal é citado como o suposto pai). Os rumores não só afetaram a reputação profissional de Seberg, mas sua vida pessoal. Ela tentou suicídio várias vezes, e em 1979 foi encontrada morta em carro, não muito longe de seu apartamento em Paris. Sua morte foi traçada como um possível suicídio. Seu ex-marido, o escritor Romain Gary, culpou o FBI por sua morte, alegando que as investigações da agência causou danos emocionais extensivos e permanentes.

Seberg não descreve esse final – as circunstâncias da morte da atriz são ditas em um intertítulo enquanto o filme termina. Isso é importante, porque Stewart interpreta Seberg como uma mulher cheia de vida – ela está mantendo Jean viva para nós pelos momentos em que podemos assisti-la na tela, e esse tempo é precioso. Stewart não é uma imitadora, o que é motivo pelo qual, nos primeiros momentos de Seberg, eu achei que ela fosse a escolha errada. Mesmo com seu cabelo perfeitamente descolorido, e mesmo que ela não tenha aperfeiçoado aquele bico elusivo de Seberg, eu olhava para ela e conseguia ver apenas Stewart, vibrante e corajosa com seu jeito gaguejante. Um pouco mais tarde, eu vi o quanto estava errada. Como atriz, Stewart é um recipiente, não a motorista de um veículo. Ela não “aprendeu” Seberg, ela se abriu para essa mulher triste e perdida, permitindo que ela entrasse para completar cada canal e veia. Stewart escuta a linguagem dos fantasmas, e ela traduz para nós. As palavras estão todas ali, encontrando a saída por meio da luz de seus olhos.

Fonte | Tradução: Equipe Kristen Stewart Brasil