Kristen é capa da revista francesa Les Inrockuptibles e conversou com eles sobre Underwater, The Chronology of Water e mais! Confira:

Você afirmou repetidamente que não gosta de nadar e não fica confortável na água. Ainda assim, você concordou em estrelar em um filme que se passa totalmente no fundo do mar. Essa é uma maneira de superar seu medo?
Estranhamente, não estar confortável na água provavelmente me levou a ser uma boa – pelo menos não tão ruim – nadadora. Posso sair rápido da água se precisar! [Risos] Mas, sim, brincadeiras à parte, eu tenho medo da água, do seu peso, da escuridão, da dificuldade de se mover lá dentro, seja você um bom nadador ou ruim. Eu sou controladora, e na água eu perco o controle.

Mais especificamente, foi a jornada da personagem que me interessou. O fato de que começo de roupas íntimas, escovando os dentes, alheia ao perigo iminente – resumindo, começar com uma personagem virgem, que sabemos quase nada, e que continuaremos sem saber por um bom tempo. É algo que eu gosto.

É uma mudança dos cenários clássicos, onde após dez páginas você precisa aprender isso e aquilo. Estamos lidando com uma pessoa que tem dificuldade de existir, que parece inacessível, inexpressiva, solitária, dura…

Como se ela fosse uma caricatura do homem herói. Então, Nora vai ficar mais forte, nós vamos entender que ela está de luto, que ela se protege do mundo. Mas quando o mundo a ataca pra valer e sua vida é ameaçada, ela vai perceber que ainda vale a pena viver.

Também é seu filme mais comercial em um bom tempo. Houve alguma atração em particular nisso, para voltar aos trilhos da indústria em Hollywood?
Realmente, eu não aceitava um filme assim há um bom tempo, e eu senti a pressão. Não do jeito que alguém me dizia, ”Você precisa fazer esse filme,” mas simplesmente porque era uma necessidade. Para continuar a fazer o que eu quero fazer, preciso estar visível. É assim que funciona.

Então eu olhei o que estava disponível no mercado e encontrei esse cenário, que me seduziu imediatamente por sua simplicidade. Não está tentando fazer muita coisa. Foca somente em uma ideia: sobreviver e reviver. Hoje, no sistema de estúdios, é quase impossível fazer coisas complicadas. Estamos em perigo de perder em todos aspectos, então é melhor ter uma ideia simples com execução perfeita.

Em adição ao lado comercial, Underwater também é um filme de ação. Com As Panteras, você fez dois seguidos, mesmo sendo um gênero que você não tocou muito até agora. Você acha que é agradável? Diria que é empoderador?
Na verdade, eu não fiz um atrás do outro, mas você entende o quão loucas essas datas de lançamento podem ser… Entre eles, eu filmei Seberg, e eu até tive bastante tempo livre, o que me permitiu escrever um projeto pessoal.

Eu nunca fiz uma escolha de carreira baseada na percepção das pessoas sobre mim. Eu vou por instinto. Para As Panteras, eu queria me sentir livre, confortável e apoiar mulheres que me apoiaram em troca. E realmente havia algo empoderador, especialmente porque estávamos rindo constantemente no set.

Underwater, como eu disse, eu fiz para superar meu medo de água, espaços pequenos e filmes comerciais [risos]. E o diretor, William Eubank, conseguiu me convencer.

Ele é um cara jovem, quase uma criança, que só fez um filme antes que é super criativo e com poucos significados, O Sinal – Frequência do Medo. Eu não me via fazendo um suspense com um diretor experiente e confiante. Me diverti muito mais tentando uma aventura, um risco.

Underwater é bem claro quanto aos filmes de James Cameron, incluindo O Segredo do Abismo e Alien, e sua personagem é bem parecida com a Ripley de Sigourney Weaver. Isso foi uma inspiração? Foi algo que você discutiu com o diretor?
Eu não assisti esses filmes especificamente, mas é inegável que foi parte da inspiração geral. Nós dois amamos esses filmes e nosso filme também os ama.

A comparação com Ripley não parece inocente para mim, já que em Underwater, como na saga Alien, estamos lidando com uma personagem feminina que vale mais do que seus atributos sexuais. Agora, você disse que está cansada de Hollywood retratando mulheres sistematicamente como objetos sexuais…
Não foi bem isso. O que eu disse foi que Hollywood precisava começar a retratar mulheres como seres sexuais, no sentido de sujeitos em controle de suas sexualidades. Eu não sou contra sexualidade no cinema, desde que seja honesto e completo, desde que não esteja lá para satisfazer algum tipo podre de status social atual, ou para excitar o espectador americano típico.

Politicamente, parece interessante para mim poder contar histórias não sexuais com mulheres, ok. Mas eu gosto de histórias com pessoas que estão vivas – ou, nesse caso, que voltam para a vida – pessoas que às vezes fazem escolhas ruins, mas estão vivendo. Nora é alguém que se afastou de tudo, incluindo de sua sexualidade.

Ela literalmente se enterrou. E ainda é um problema, não é? Quando você olha para ela, você pensa, ”Onde você está? O que você está fazendo?” Há algo triste sobre sua falta de sexualidade, um sinal de rompimento com o mundo.

Você já viu Retrato de uma Garota em Chamas da Celine Sciamma?
Sim! Que filme! Eu amei! Eu já vi todos os filmes da Celine Sciamma, ela é muito boa. E os da Adele Haenel também, eu gosto muito dela.

Você leu os comentários recentes de Adèle Haenel para a imprensa francesa sobre abusos que ela alegou ter sido vítima do diretor Christophe Ruggia?
Eu acho que nunca ouvi sobre isso, não… [Contamos brevemente] Uau! Olha, eu concordo cem vezes com elas. Denunciar um sistema em vez de dar mais poder para um monstro parece a abordagem certa. Nós somos todos fodidos de uma maneira… Qual seria uma palavra melhor que fodidos? Digamos, perdidos. Os impulsos, essas coisas estranhas que são consideradas ilegais… Todos fazemos.

O desafio é saber como medi-las, e sobretudo, garantir que elas não sejam impostas a outras pessoas para arruinar com suas vidas ou reduzir sua liberdade. Mantenha suas neuroses para si mesmo, caramba! Então, atacar um sistema e não os indivíduos, por mais perdidos que eles possam ser, é o caminho certo a seguir. Adele está certa.

Mais e mais atrizes estão indo para atrás das câmeras: Greta Gerwig, Elizabeth Banks, Clea DuVall… Você também tem um projeto em curso. Isso é um jeito de ganhar poder?
Eu só posso falar por mim mesma, mas sempre quis contar histórias desde que era criança. Eu quero deixar algo que pertence somente a mim. Eu acho que isso é comum para muitos atores, mas para me sentir legítima, tiveram que me mostrar o caminho. Eu precisei me revelar para mim mesma.

Quando você está nesse caminho, o desejo de revelar outras pessoas para elas mesmas aparece muito rápido. É como se tivessem aberto a minha torneira e agora eu quero abrir todas as torneiras da casa!

Qual o estágio do seu projeto, The Chronology of Water?
Eu prometi a mim mesma que faria em 2020. É uma autobiografia da Lidia Yuknavitch que é muito complicada de adaptar porque é fluida e estranha. É como água, difícil de pegar. Eu preciso achar a atriz perfeita para o papel principal (para ser uma nadadora profissional, bisexual e viciada em sexo, que se torna uma artista). A história acontece em quarenta anos, então, na verdade, preciso de mais de uma atriz…

Ou de um efeito de envelhecer…
Oh, não! [Risos] Antes de chegar nisso, preciso filmar o filme da Clea DuVall e o filme do Ben Foster. Mas estarei livre no final da primavera. Se nos vermos novamente em um ano e se eu ainda não estiver filmado, vou estar super frustrada!

Voltando para a metáfora da torneira aberta, você acha que o Olivier Assayas fez isso por você?
Sim. Como uma futura diretora, ele me desbloqueou, claramente. Como atriz, é diferente, eu só preciso segui-lo. Tudo o que eu preciso fazer é ser humana, me misturar com o molde que ele cria. É incrivelmente natural e eu amo. O Olivier é muito engraçado, sabia? Porque ele nunca leva o crédito. Ele diz coisas como [ela começa a imitá-lo]: ”Eu não sei o que aconteceu, eu só escrevi umas coisas, filmei e foi isso.”

O que ele me ensinou é que quando você tem algo em você, isso flui naturalmente; e se não fluir, não faça. Não que fazer filmes seja fácil, mas o desejo precisa ser compulsivo.

Olivier é como meu irmão mais velho. Sempre que o vejo é mais do que alegria, é um alívio. Eu enviei para ele meu roteiro para descobrir o que ele achava. E ele disse, ”Você ainda não chegou lá, mas o fato que você está fazendo um filme atrás do outro é bom. Você está no caminho certo.”

Tenho muita sorte de ter um mentor assim! Ainda tenho chance, não tenho?

Fonte | Tradução: Equipe Kristen Stewart Brasil